• Non ci sono risultati.

View of Francisco Martínez, ed, Politics of recuperation: Repair and recovery in post-crisis Portugal, London and New York, Bloomsbury, 2020, pp. 256

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Condividi "View of Francisco Martínez, ed, Politics of recuperation: Repair and recovery in post-crisis Portugal, London and New York, Bloomsbury, 2020, pp. 256"

Copied!
4
0
0

Testo completo

(1)

2020 | ANUAC. VOL. 9, N° 2, DICEMBRE 2020: 179-182

R

ECENSIONI Francisco MARTÍNEZ (ED) | Politics of recuperation: Repair and recovery in post-crisis Portugal, London and New York, Bloomsbury, 2020, pp. 256.

A austeridade despedaçou Portugal. Ao longo da última década foi neces-sário voltar a colar o país, peça por peça. Mas como e para quem? Editada por Francisco Martínez, esta antologia oferece-nos um retrato etnográfico das micro-práticas culturais mobilizadas para recuperar da austeridade, sublin-hando o caracter político do quotidiano e a importância da dimensão mate-rial na resposta social às múltiplas crises que ocorreram em Portugal. Fre-quentemente excluído da política, o trabalho quotidiano com a materialida-de é neste livro reconsimaterialida-derado como fundamental na regeneração materialida-de relações afetivas e no esforço para afirmar possibilidades alternativas de transfor-mação social, económica e epistemológica.

Organizada em nove capítulos, na introdução da obra Francisco Martínez operacionaliza a ideia de recuperação, conceito que permite reconhecer a di-mensão política do quotidiano e o papel dos pequenos gestos no compor e recompor do mundo. A recuperação é uma micro-prática que pode reprodu-zir ou contestar estruturas, reforçar laços sociais e prefigurar subjetividades dominantes ou alternativas. Mais importante, esta ideia abre a possibilidade de reconsiderar os grupos mais vulneráveis da sociedade não como vítimas passivas da crise e da austeridade, mas como agentes criativos engajados em abrir espaço para a sua contestação e transformação. É sobre este tema que se debruçam os capítulos seguintes.

Ema Pires transporta-nos ao Monte da Pedra, registando a forma quase poética como a crise potenciou gestos de empatia, solidariedade e lealdade que reconfiguraram o espírito de comunidade e as relações entre os habitan-tes. Pelos olhos de Margarida, Alberta e Josefina, a autora mostra como a re-cuperação nas zonas rurais, onde as crises são regra e não exceção, se mate-rializou através de uma lógica de reciprocidade, patente tanto em simples trocas de serviços e pequenos empréstimos ou em relações de clientelismo.

André Novoa debruça-se sobre a Cooperativa Fruta Feia, projeto que pre-figura um modo alternativo de distribuição e consumo e onde a recuperação se materializa na construção de uma rede de colaboração inter-espécies que This work is licensed under the Creative Commons © João Terrenas

2020 | ANUAC. VOL. 9, N° 2, DICEMBRE 2020: 179-182.

(2)

180 FRANCISCO MARTÍNEZ (ED) | POLITICSOFRECUPERATION

abarca produtores, consumidores e a própria fruta. Todavia, ao concentrar-se apenas na recuperação dos excessos do capitalismo, concentrar-sem questionar a ne-cessidade de reduzir os crescentes níveis de produção, consumo, ou movi-mento que o tornam possível, este projeto acaba por contribuir para otimizar mais do que contestar o status-quo.

Giacomo Pozzi explora a recuperação habitacional em Santa Filomena, onde a apropriação da terra e a edificação improvisada de habitações infor-mais serviram para reduzir a vulnerabilidade e construir uma identidade par-tilhada. A bibliografia social destes edifícios oferece-nos um ponto de vista privilegiado sobre o potencial transgressivo do urbanismo improvisado, mo-strando como a identidade coletiva e as relações sociais entre os habitantes do bairro se consolidaram em paralelo com a progressiva utilização de mate-riais cada vez mais resistentes na sua edificação, do cartão, à madeira, ao ci-mento.

Chiara Pussetti e Vitor Barros percorrem a trajetória do EBANOCollective, um projeto que pretende democratizar a cultura e promover o direito à cida-de. Olhando para três exemplos, explicam como as práticas coletivo foram gradualmente apropriadas por políticas culturais cujos efeitos não só contri-buem para a gentrificação da zona como aceleram todo o processo. Para além de exporem a dualidade da arte urbana, entre modo de resistência e prática de resiliência, revelam como Lisboa é um local particularmente fértil para compreender a crescente subordinação da cultura ao capital.

Marcos Farias Ferreira e Francisco Martínez exploram os esforços regene-rativos para transformar uma antiga fábrica de tecidos num espaço cultural e criativo, onde se encenam formas radicais de ser e de estar no mundo e no qual a recuperação de um espaço coincidiu com a recuperação da esperança e do político. Da dança ao teatro, do cinema à pintura, a Fábrica de Alternati-vas serviu de palco a um processo quase terapêutico de convívio, intercâm-bio e regeneração coletiva. Forjada por uma sequência de gestos improvisa-dos, a forte componente material da fábrica foi determinante para que em meses fosse possível transformar uma peça do capitalismo num espaço de resistência.

O impacto social do urbanismo neoliberal é o tema abordado por Luís Mendes e André Carmo, que rastreiam a genealogia do modelo neoliberal de planeamento urbano em Portugal e o seu efeito como multiplicador de desi-gualdade e insegurança sistémica. Em seguida, analisam os esforços recupe-rativos da Habita, associação cujas práticas visam ampliar o acesso ao espaço público e o direito à habitação, promovendo o planeamento urbano assente numa lógica mais horizontal, participativa e inclusiva.

(3)

FRANCISCO MARTÍNEZ (ED) | POLITICSOFRECUPERATION 181

Inês Lourenço explora a relação entre as dimensões simbólicas e materiais da recuperação, seguindo de perto todo o processo que levou à edificação de um novo templo Hindu em Santo António dos Cavaleiros. Fruto de um inten-so procesinten-so de negociação e sujeito às contingências financeiras, o planea-mento e construção do templo contribuiu para restabelecer relações e valo-res entre a diáspora, criando as condições materiais que necessárias para for-talecer o diálogo intergeracional e ampliar a sua inclusão e visibilidade na sociedade portuguesa.

Maria Manuela Restivo e Luciano Moreira analisam as tensões inerentes à recuperação da arte popular portuguesa, mostrando como os esforços para recuperar, regular, certificar e reclassificar a arte popular não se têm neces-sariamente manifestado na melhoria das condições sociais e materiais dos artesãos. Apesar do seu potencial transformativo, a recuperação das práticas artesanais portuguesas foi orientada por uma lógica de mercado que visa permitir aos turistas aceder, comprar e encontrar pessoas, locais e objetos autênticos. Torna-se necessário questionar o que estamos a recuperar e com que propósito.

Livia Jiménez Sedano leva-nos até ao mundo dos aficionados pelo qui-zomba. A forte componente ritualística, o seu ritmo lento e proximidade físi-ca tornam esta dança numa prátifísi-ca potencialmente transgressiva que desafia a crescente imprevisibilidade, aceleração e enfraquecimento dos laços so-ciais do quotidiano urbano. A obsessão pelo quizomba é uma forma de tentar forjar relações, de contestar o isolamento, de experienciar um sentimento de pertença, de recuperar a o controlo sobre a sua vida e sobre o seu corpo. Contudo, para os aficionados dançar não é entendido como uma estratégia para resistir à crescente precaridade e insegurança económica, mas como um mecanismo para as tornar suportáveis.

Por fim, Tomás Sánchez Criado realça a importância que as micro-práticas de recuperação podem assumir no esforço coletivo para reimaginar não só as sociedades mais drasticamente afetadas pela crise como responder aos desa-fios do projeto político Europeu. É essa também a mensagem de Isabel Da-vid, para quem a recuperação merece ser explorada em escalas mais alarga-das, indispensáveis para compreender o contexto da crise em Portugal, e a forma como esta perpetua um sentimento generalizado de insegurança onto-lógica.

Esta antologia oferece um dos mais sofisticados relatos antropológicos so-bre a sociedade portuguesa no pós-crise. Para além da inovação teórico-con-ceptual forjada pelas ideias de recuperação e reparação, o livro dialoga com uma agenda epistemológica cada vez mais interessada em desenvolver meto-dologias pós-antropocêntricas, que exaltam a agencialidade das coisas e a

(4)

182 FRANCISCO MARTÍNEZ (ED) | POLITICSOFRECUPERATION

sua capacidade para reproduzir ou transformar estruturas, relações e subjeti-vidades. Além disso, abre novas linhas de investigação nos debates sobre a resposta à crise no contexto português, reforçando a necessidade de ir além da esfera pública e mapear os esforços regenerativos materializados no seio da vida privada. Por estes motivos, trata-se de uma obra indispensável para antropólogos, sociólogos, geógrafos, e cientistas políticos que se interessem pelas recentes transformações da sociedade portuguesa e queiram perceber o complexo repertório cultural mobilizado neste contexto.

João TERRENAS CEI/ISCTE-IUL / University of York jdmts@iscte-iul.pt

Riferimenti

Documenti correlati

Teriparatide nel trattamento dell’osteoporosi primaria e indotta da glucocorticoidi (GIO)in pazienti con Lupus Eritematoso Sistemico (LES).Effetti sui marcatori del turnover

21 e 12 della Carta dei diritti fondamentali UE, 26 e 22 della Convenzione internazionale sui diritti civili e politici, 14 e 11 della Conven ione europea dei diritti dell uomo. 73

una figura insostituibile nella casa di Trimalchione, ideatore nascosto delle pietanze più strane, il cuoco, rivela la natura della sua arte nel nome: Dedalus vocatur 52 esclama

Simulated water levels and ground displacement values were compared with available hydraulic head data and PS subsidence data all over Pistoia aquifer, in order to evaluate the

Sediments from Sunda trench Sediments from Philippine thrench Sediments from trench GLOSS 0.1 1 10 100 1000 10000 lamproite carbonatite. kamafugite

equipped with fairly general measures, are included in our discussion. Also, Sobolev-type norms built upon any rearrangement-invariant Banach function norm are considered. The use

È questo un codice della fine del XIII secolo, che tra l’altro Langlois descrive come composito 16 e considera molto buono per la seconda parte, tant’è che lui stesso vi

Almeida RPP, Porcelli F (2016b) Spittlebugs as vectors of Xylella fastidiosa in olive