• Non ci sono risultati.

European University Institute Department of History and Civilization ISTITirW |iwnfnisrrM>m 1 5GEN.200J

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Condividi "European University Institute Department of History and Civilization ISTITirW |iwnfnisrrM>m 1 5GEN.200J"

Copied!
494
0
0

Testo completo

(1)

I D í ' , o

) -V * N t í '

European University Institute

D epartm ent of History and Civilization

ISTITirW |iwnfnisrrM>m

1 5GEN.200J

Ü I 1)

L 1

J

A> JlJ s i * 4 1

AS DUAS DITADURAS IBÉRICAS NA NOVA ORDEM

EUROFASCISTA (1936-1945)

A u to d e fin ig S o , m u n divisS o e H o lo ca u sto no S a la z a ris m o e no F ra n q u is m o .

By

M anuel L o ff

V olum e II

T h e s is su b m itte d fo r a s s e s s m e n t w ith a v ie w to o b ta in in g th e d e g re e o f D o c to r in H istory and C iv iliz a tio n

fro m th e E urop e an U n iv e rs ity In s titu te

Florence, January 2004

(2)
(3)
(4)
(5)

3 0001 0041 1697 8

European University Institute

Department of History and Civilization

AS DUAS DITADURAS IBÉRICAS NA NOVA ORDEM

EUROFASCISTA (1936-1945)

A u to d efin ig áo , m u n divisáo e H olocausto no S ala za rism o e no F ranquism o.

Volume II

-Presented by

Manuel Loff

To th e Jury :

- P rof. L o u isa P asserini - P rof. P h ilip p e S chm itte r - P rof. H ip ó lito de la T o rre - P rof. F ernando R osas

Thesis submitted for assessment with a view to obtaining the degree of Doctor in History and Civilization

from the European University Institute

(6)
(7)

AS DUAS DITADURAS IBÉRICAS NA

NOVA ORDEM EUROFASCISTA

(

1936

-

1945

)

Autodefínigao, mundivisao e Holocausto no

Salazarismo e no Franquismo.

Volume 2: 3a Parte

Ph.D. Dissertation

Supervisor:

Prof.SSa Luisa Passerini

(I.U.E., Firenze)

Co-supervisor:

Prof. HipolitO de la TOrre

(U.N.E.D., Madrid)

Instituto Universitario Europeu/European University Institute

(8)

LIB

9 4 6 .9 0 4 2 l o f / &

/ £

%

f t** !

^

o '

.'H ,, x ■

L í

A '■ ^ '■:;i i ;mx ^

r*j

**

*

(9)
(10)
(11)

CAPÍTULO 6: O «SANEAMENTO» POLÍTICO DA EUROPA

6.1 A «grande mentira» de Versalhes e de Genebra

Esta visáo de urna conjuntura internacional, correspondente á segunda metade da década de '30, constituindo urna verdadeira «prova de fogo» da capacidade europeia de correcgáo dos «caminhos do erro» que o Tratado de Versalhes havia significado - utilizamos aquí as expressoes com que Manuel Aznar1 intitula, respectivamente, as quarta e primeira parte de urna monumental Historia de la Segunda Guerra Mundial (AZNAR, 1941) que se comega a publicar significativamente em 1941, como se a guerra tivesse praticamente terminado2... partia, obviamente, do pressuposto que tal tratado resultava da «rienda suelta que, sobre la angustia de Europa, Uoyd George y Clemenceau habían dado a sus respectivas violencias de carácter», produzindo o que «para unos [era] un crimen; para otros, un desencanto; para los presuntos beneficiarios, una gran mentira» (AZNAR, 1941:4-5).

É sintomático que quando as duas grandes potencias fascistas europeias desencadeiam urna sucessáo de golpes sobre o sistema internacional criado em Versalhes e teóricamente gerido a partir de Genebra, em Madrid e em Lisboa identificar-se-á nos acontecimentos doses importantes de «realismo», como sinónimo de «clareza», que operava um verdadeiro «saneamento» sobre um continente «doente». Por isso mesmo também de «libertagáo» falam os textos oficiáis e oficiosos dos dois regimes. Aínda antes de desencadeada a guerra mundial, o «continente lenta pero irremediablemente va libertándose de las cláusulas paralizantes» do Tratado de Versalhes (BARCIA, 1939: 309). «Libertagáo», «salvagáo». Para Salazar, no mesmo registo, a Alemanha fora «impelida para o regime que consubstanciava, senáo a revindita [da derrota de 1918], ao menos a unidade, a plenitude da soberanía e a recuperagáo da anterior grandeza». Por outras palavras, o Nazismo fora a «salvagáo» da Alemanha, e o Pacto de Munique, em Setembro de 1938, confirmava, segundo Salazar, como fora «insensato supor que a Alemanha poderia indefinidamente resignar-se ou viver numa espécie de menoridade que violentava a sua consciencia nacional». Mais: «privaría em qualquer caso a Europa da extraordinária capacidade de organizagáo e de trabalho de muitas dezenas de milhóes de homens superiormente apetrechados e cultos» (SALAZAR, 1943: 107-08), num discurso típico das direitas europeias desde fináis do séc. XIX, francas admiradoras da Alemanha laboriosa, disciplinada e culta que percepcionavam desde tempos bismarckianos.

O motor de tal «emancipagao» seriam, para Barcia Trelles, essas «dos realidades de tipo genérico, cuyo estudio y consideración han de merecer por nuestra parte vigilante atención» (BARCIA,

1 Avó do actual Presidente do Govemo espanhol; como Augusto de Castro em Portugal, também Aznar era um jomalista-arau/o do regime franquista e ocasional diplomata de nomeagáo política.

2 Aquando da publicagáo deste volume, os editores assumem que «después de muchas reflexiones e de escuchar la opinión de personas versadas en estas materias, nos hemos decidido a editar» este livro aínda que fosse «pleno y cada día más gigantesco desarrollo el colosal choque de ideologías y de fuerzas bélicas» (p. V). A obra concluír-se-á com a publicagáo do Tomo XII, em 1948.

(12)

3 8 4

1939: 13): o Pacto Antikomintem e o Eixo fíoma-Bertim. Quanto ao primeiro, nâo no-Io esqueçamos, a Espanha nacional prestou a sua adesáo a 21 de Fevereiro de 1939, sem esperar sequer pela proclamaçâo final da vitória sobre as forças republicanas3, tomando-se o prim eiro aderente depois da assinatura fundadora do pacto. Barda chamava a atençào para o pacto genmanoitaliano, com cuja «preexistencia los españoles hemos de contar necesariamente al modelar nuestra orientación internacional», já que ele «constituye actualmente [- 1939 -] la máxima coyuntura de paz en Europa; implica a la vez una posibilidade de construcciones y depara a quienes lo integran una evidente libertad de movimientos» (BARCIA, 1939:13 e 19)4. «Accesible a todo Estado dispuesto a laborar por la reconstrucción europea», «el propósito pacífico» que o intemacionalista espanhol descobria «animar el eje Roma-Berlim no constituye una aspiración estática». Efectivamente,

«Italia y de modo especial el III Reich tienen pendientes de solución varios problemas, unos continentales otros extraeuropeos. Los primeros hasta el presente fueron solucionados por el Führer de modo incruento. Pero nadie puede asegurar que en lo sucesivo ese sistema de realizaciones no coercitivas pudiera reiterarse» (BARCIA, 1939:17 e 25).

Era forçoso, portanto, que o novel regime obsesivam ente condenasse e procurasse eliminar, «corrigir», o que descrevia como sendo urna postura «antiespanhola» da Franga e da Inglaterra, que teria sido assumida durante a pròpria guerra civil, e que se reiterava na permanente oposiçâo às pretensóes espanholas formuladas no quadro de urna nova «vontade de Impèrio». Díaz de Villegas5, para quem, repetitivamente, «la política española, netamente africana, primordialmente africana, fundamentalmente africana, ha sido obstaculizada desde hace dos siglos y medio por Inglaterra y Francia», perguntava-se «cómo se ha podido hablar de nuestra coincidencia de intereses con las potencias occidentales?» (DÍAZ, 1941: 91). E ñas «Palabras previas», por exemplo, com as quais Castiella e Areilza pretendem esclarecer as suas intençôes con a publicaçâo do livra Reivindicaciones de España, afirma-se que este

«es un simple alegato en favor de los derechos de España, despreciados, heridos de muerte durante más de cien años por la política exterior de Londres y París. (...) si por detrás de cada ocasión frustrada de engrandecimiento patrio encontramos el espíritu británico, o la diplomacia francesa malogrando el intento, no será por culpa nuestra que al relatar los episodios se dibuje reiteradamente la sistemática interferencia de ambos los Imperios en nuestra órbita vital» (AREILZA; CASTIELLA, 1941:19-20).

3 Já antes, no entanto, o govemo de Burgos havia assinado protocolos político-diplomáticos significativos com os dois polos do E ixa com a Italia em Novembro de 1936, com a Alemanha em Margo de 1937 e, dois anos mais tarde, um verdadeiro Tratado de Amizade. Cf. os respectivos textos in Documentos secretos...: 21-23, e DELZELL, 1970: 285-86 e 318-21.

4 Manuel Aznar considerava-o «la realidad políticomilitar más poderosa que Europa ha conocido en mucho tiempo» (1941:256).

5 Um dos m ilitares com maior presenga política ñas esferas do poder, designadamente as relacionadas com a administragáo colonial, desempenhando por largos anos (1945-68) o cargo de Director-General de Marruecos y Colonias (departamento da Administragáo central rebaptizado de Plazas y Provincias Africanas em 1956, com a independéncia de Marrocos), em simultáneo com o de director do Instituto de Estudios Africanos (mais conhecido pela sigla IDEA).

(13)

Contra esta interferencia clamava também nos prímeiros anos da II Guerra Mundial Manuel Aznar, numa curiosa (e tipicamente franquista) explicaçâo da aparente contradiçâo entre urna «posición de honrada intransigencia respecto a Gibraltar [que] no se ha encendido en nuestros pechos con ocasión y motivo de la guerra presente» e a «satisfacción» com que «el reciente [- 1940 -] Acuerdo [comercial] firmado por Inglaterra y Espanha, la amplia modificación del clearing entre los dos países» fora recebido em Espanha. Perante a obvia dependência, impoténcia até, económica, a Aznar nao restava mais que sustentar que:

«España quiere desarrollar y ampliar su triunfo, el de su Historia, el de su Caudillo y de sus juventudes heroicas, en el ámbito de los principios morales y políticos (...). Este lenguaje choca, sin duda, con las antiguas fórmulas exclusivas de importación y exportación, debe y haber, balanza de pagos y superávit o déficit comercial (...). Hoy, al concepto directo y elemental de "dinero" se ha opuesto el de "sacrificio". A falta de reservas de oro y en medio de su economía empobrecida, España tiene inmensas disponibilidades de ese nuevo "patrón" - el sacrificio -, infinitamente más fuerte que el oro» (AZNAR, 1940:28 e 18-196).

Era inevitável que qualquer retórica nacionalista que tornasse conta do Poder em qualquer um dos dois Estados ibéricos na primeira metade do séc. XX, manifestando, com maior ou menor intensidade, intençôes expansionistas, como no caso espanhol, e rebe!ando-se contra urna situaçâo de dependencia, acabasse por agredir, verbalmente que fosse, as duas potencias hegemónicas da Europa Ocidental e do mundo colonial. É sabido que, por urna infinidade de razoes, entre as quais inevitavelmente estáo presentes as condiçôes daquela mesma dependencia, tal agressividade nao conduziu a Espanha franquista, muito menos o Portugal salazarista, a um confronto militar com ambas. Mas a agressáo ideológica está lá, inegável.

Politicamente fajando, seria através da «engrenagem de Genebra (imaginada e construida por Wilson, Briand, Uoyd George e outras bonzos da maçonaria internacional)» que «os últimos [sic] abencerragens do velho mundo liberal-democrático procuravam manter o seu dominio», contra o quai «as juventudes da nova Europa, terminada a Guerra, esforçavam-se por encontrar outras rumos, preparando a Revoluçâo necessària» (AMEAL, 1938:12). Salazar recordava, em Margo de 1938, o ambiente tomado pela anexaçâo hitleriana da Austria, que «tínhamos razáo quando asseverámos nao poder ser cometido m aior erro que alinhar os povos por ideáis de política intema, contrapondo-os depois, e fazer projectar nas relaçôes intemacionais as simpatías dos govemantes pelos sistemas políticos». Este quadra argumentativo explicaría a ineficácia «duma fraseologia sem sentido» que presidiría à experiencia da Sociedade das Naçôes, cuja entrada o Governo portugués procurara barrar «aos Sovietes», por forma a «preservar a S.D.N. da infiltraçâo comunista» (SALAZAR, 1943: 36)7. Pelo contrario, desde que o Governo nazi se retirara da S.D.N. os dirigentes portugueses asseguravam «[partager] la préoccupation des États qui voudraient ramener à Genève les pays qui, comme l'Allemagne, représentent, par leur force

6 Itálico no original.

7 Cf. in MATTA, 1937:153-58 o discurso de Caeiro da Matta, de 17/9/1934, a justificar o voto contràrio portugués.

(14)

t t M t á M N M X f É i L U J

3 8 6

et par leur prestige, un élément essentiel de l'équilibre européen», empenhando-se «de notre mieux» p a ra o conseguir (MATTA, 1937:171-728).

A Espanha de Franco foi bem mais longe na sua rejeigao da política genebrina. A 8 d e Maio de 1939, pouco mais de um més depois do triunfo m ilitar definitivo sobre a República, o Govemo d e Madrid abandona a Sociedade das Nagoes, mimetizando a actuagáo do Japáo (27 de Margo de 1933), d a Alemanha nazi (que saíra a 19 de Outubro de 1933), da Itália (11 de Dezembro de 1937), da Hungría. A crítica franquista da instituigáo que pretenderá velar pela paz percorre a repetida denuncia das poténcias revisionistas - «Nacida con pretensiones universales, se convirtió rápidamente en el instrumento exclusivo de Inglaterra y Francia», escrevia o Mundo em 1940 -, mas preferia acima de tudo argum entos tradicionalistas, abertamente reaccionarios: «la institución ginebrina», insistia-se no Mundo, emergira «de abolengo protestante o francés» e, portanto, «no tiene nada que ver con las ideas madres españolas de Imperio y Cristiandad»9; para Juan Beneyto, «desde que se crea la Sociedad de Naciones, el Derecho de gentes se recuesta en el lecho mortuorio». O que é que tal significava? Que «a la idea, a la norma, con su sabor de pan y de vino, de fatiga y de fervor, de oración y de trabajo, sucede la técnica, el procedimiento, “rapports”, libros, revistas..., un verdadero taller jurídico, como una fábrica moderna». Por outras palavras, á Natureza e á Tradigao, sucederá urna fórm ula contemporánea de burocracia internacional. Dentro desta lógica dicotómica, parecía divertir-se o ideólogo franquista perante «algunos señores orundos que (...) se alarmaron cuando la actitud de los países totalitarios [- de abandono deliberado de la organización -] dejó a la Sociedad de Naciones como una Liga adocenada» (BENEYTO, 1940: 191-92), em oposigao á

viiilidade de que estes propagandistas sempre revestiam as acgóes fascistas.

Nos dias da derrota francesa, o Mundo de Madrid retomava esta imagem de dois «pueblos jóvenes, pletóricos de vigor, como la Alemania y la Italia de Hitler y Mussolini», que «duramente [habían suportado] (...) la irritante demostración de injusticia, de ambiciones desmedidas y de arbitrariedades sin cuento» que constituirá «el mapa de Versalles». Desenvolvia-se entáo, a partir do prisma franquista, urna «guerra de 2 pueblos pobres, superpoblados y proletarios contra dos Imperios de inagotables recursos de toda índole, (...) cuyo final», nao se duvidava, «va a establecer un orden nuevo»10.

6.2 « A rtificio s sem sentido»

Erigindo o passado histórico das suas respectivas pátrias (termo quase obsessivo nos dois casos) nessa qualquer coisa de «permanente» de que falava Salazar, nessa «misión universal que

8 Discurso perante o Conselho da S.D.N., 17/4/1935.

9 In «La agonía de la Sociedad de Naciones», in Mundo, n9 14 (11/8/1940), Madrid, pp. 15-18. 10 «El mundo que la guerra actual va a modificar», in Mundo, ne 7 (23/6/1940), Madrid, pp. 20-21.

(15)

tiene España, exclusivamente española, que cumplir, y que todos los españoles tienen que laborar para su ejecución a) servicio de la Patria» (CORDERO, 1944:17), nao faltaram as ocasioes para demonstrar o maior desprezo pelas entidades «pseudo-nacionais» artificialmente criadas em Versalhes, opondo-lhes, por exemplo, «a identidade territorial e a unidade nacional [portuguesas] mais perfeita da Europa, urna das maiores vocaçôes de universalismo cristáo» (SALAZAR, 1943: 257). É este um dos campos preferidos da agressividade semántica do discurso salazarista e franquista sobre a Europa.

Ao contràrio de muitos outros Estados, «Portugal nunca perdeu a sua individualídade nacional, nem sequer a sua personalidade política com o Estado jurídicam ente independente»; mesmo quando «um rei espanhol pela primeira vez cingiu a coroa portuguesa, éramos urna Naçâo definida com tanta nitidez que a nenhum poder humano seria possível tentar desvanecer-lhe o carácter», garantía em 1940 Marcello Caetano. «Éramos nos, bem nós: nao pederíamos já ser outros» (CAETANO, 1944:57-5811). «De nós», dizia Salazar em Junho de 1940, em plena derrocada francesa, «se nao pode afirmar que nao soubemos que fazer da nossa independencia (...). Para isso nos serviu a liberdade (...): trabaihando e recebendo em nossa carne duros golpes, descobrimos, civilizamos, colonizámos. Através de sáculos e geraçôes mantivemos sempre vivo o mesmo espirito». A Historia (urna vez mais eia...) tudo explicava:

«A Pàtria Portuguesa nâo foi o fruto de ajustes políticos, criaçâo artificial mantida no tempo pela aeçào de interesses rivais. Foi feita na dureza das batalhas, na febre esgotante das descobertas e conquistas, com a força do brago e do gènio. Com traballio intenso e ingrato, esforços sobre­ humanos na terra e no mar, ausencias dilatadas, a dor, o luto, a misèria e a fome, almas de heróis que amalgamaran!, fizeram e refizeram a Historia de Portugal» {SALAZAR, 1943:257-58).

Sendo Portugal urna «pequeña naçâo» europeia, apesar de toda essa vocaçào «universal», é natural portanto que o Salazarismo enveredasse por formas muito mais crípticas de verificaçâo da necessidade de urna «limpeza» e «simplificaçào» no complicado mapa das fronteiras europeias. Táo tarde quanto Maio de 1944, o ainda ministro de Portugal em Vichy, Caeiro da Matta12, questionando-se diante do I! Congresso da Uniào Nacional acerca do «futuro estatuto jurídico-polftico dos pequeños Estados europeus», advertía que

«a Europa nâo viverá - ou teremos, pelo menos, urna Europa diminuida - se nâo forem respeitadas todas as naçôes dignas desse nome, isto é, as que têm urna personalidade bem marcada, urna cultura secular, urna economia suficiente, tradi çôes, urna historia, e que têm assim justificado o seu direito à existência» (MATTA, 1951:18-19).

Era assim mais do que claro que todas as restantes naçôes nâo beneficiariam desse «direito à existencia»... O Franquismo, exorcizando pelo seu lado qualquer dúvida sobre a consistência do carácter unitàrio do Estado espanhol, também nâo perdeu ocasiáo alguma que se Ihe apresentasse para

11 Discurso «As liçôes do 1® de Dezembro», 1/12/1940; sublinhado no original.

12 Ministro dos Negocios Estrangeiros em 1933-35, chefe da delegaçâo portuguesa junto da S.D.N. em 1935-37, retomou aquele lugar ministerial justamente quando Salazar, em 1947, interrompe onze anos de acumulaçâo de várias pastas gobernativas, depois de, desde o seu regresso de França, em Setembro de

(16)

3 8 8

mostrar o seu mais profundo desprezo pelas entidades «"pseudo-nacionales*» a rtific ia lm e n te «“concebidas y paridas"» em Versalhes, algumas, como a Checoslováquia, na opiniáo de Eugenio d’O r s em 1937, verdadeiros «"monstruos so color de naciones“» (cit. ín RODRÍGUEZ-PUÉRTOLAS, 1 9 8 6 : 14613). «"Hay muchas naciones, tantas como fronteras, y muchos estados“», escrevia Rafael S án ch ez Mazas no Arriba em 1943, «"pero Patrias hay pocas. Una de ellas"», evidentemente, «"la nuestra: E spaña. (...) Qué otra Patria puede alegar semejante razón de pervivencia histórica?"» (cit. in R O DRÍG UEZ- PUÉRTOLAS, 1986:337-38).

Os teóricos alemáes da Nova Ordem lidavam com conceitos muito semelhantes. « A ll European peoples and States that have proved themselves historically are welcome as members of th e new Europe», escrevia Karl Megerle, sintetizando a visáo que a partir de Beriim se difundía da N o v a Europa em Setembro de 1941. «Our only requirement of European States ¡s that they be sincere a n d enthusiastic members of Europe» (transcrito in LIPGENS, 1985: 8714). A crítica ao oitocentista p rincipio das nacionalidades que se enunciava a partir das capitais do Eixo, temida como hostil á independéncia portuguesa por alguns como Armindo Monteiro, era, porém, partilhada por outros em Portugal, p o r exemplo, por um jovem teórico salazarista como Silva Dias, para quem «a Inglaterra e a Franga langaram máo [no período de entre-guerras] do principio das nacionalidades como instrumento de dom inagáo económica» de vastas zonas do continente europeu. Dias citava até um autor franquista, Higinio París, que tena afirmado que «"o respeito das nagoes pequeñas converteu-se na arma mais eficaz de a s submeter a urna verdadeira subordinado política e a urna escravatura económica"» (cit. in DIAS, 1945: 25715), tese que nao pode deixar de ser surpreendente quando adoptada por um publicista de um p a ís pequeño como Portugal...

Quem em Espanha estudava as possibilidades económicas de urna Nova Ordem, com o este Higinio Parts, a questáo estava em definir um conjunto de «naciones fuertes», urna vez que «sólo entre [éstas] es posible establecer una verdadera colaboración» (PARIS, 1941: 260). E logo o influente Carrero Blanco propunha urna d e fin id o centrada na capacidade m ilitar.

«una nación [sólo] tiene personalidad propia en el concierto internacional y puede por tanto cum plir una misión histórica, cuando es una nación m ilitarmente fuerte, cuando es una potencia militan»(CARRERO, 1941:16316).

Para os franquistas, no fundo, «a aquellas nacionalidades que no son la expresión de una realidad histórica, geográfica o racial, no quedarán en el futuro otra perspectiva que la de continuar sometidas a una servidumbre económica, o la de unirse a otras naciones a través de un proceso de absorción o de una asociación voluntaria» (PARIS, 1941:260).

13 Extraído de «El masoteratos», in Arriba España, 21/7/1937. 14 «Positive themes for press and propaganda», 27/9/1941. 15 Itálico no original.

16 Itálico no original.

(17)

Seria este o caso de Portugal, como, afinal, insinuara o proprio ministro Serrano Suñer a Theotónio Pereira em 1940? Terminassem «enquanto era tempo» os portugueses «com a aiianga inglesa e procurassem chegar o mais depressa possível a urna alianga m ilitar com a Espanha», teria dito Serrano, e «[acolhessem-se] à suserania da Espanha se [quisessem] que eia nao abandonasse [Portugal]» (C.L.N.R.F., 1990: 316, 31917). Em todo o caso, «la implantación de un nuevo orden económico exige como condición previa alcanzar un nuevo equilibrio de fuerzas y terminar con la organización territorial artificiosa, que existía en el mundo al iniciarse el siglo XIX y que se mantiene en gran parte en la fecha presente» (PARIS, 1941:260).

Quem estava entáo a mais no mapa político europeu? Quem, afina!, pelo artificialismo da sua constituigáo, pela sua debilídade estrutural, se deveria «associar» a urna «nagáo forte» ou resignar-se a ser «absorvido»? Os publicistas espanhóis nao hesitavam, claro, em apontar exemplos, o que nao nos pode surpreender; mais surpreendente é que fossem acompanhados também por portugueses... A Checoslováquia, antes de qualquer outra, tora urna «criagáo artificial obra do Tratado de Versalhes». Salazar insinuara-o, um jovem diplomata com grande futuro no regime, Franco Nogueira, escrevera-o18; no Mundo franquista, eia era descrita como «un mosaico pintoresco de nacionalidades», um «nuevo Imperio austriaco», um «país débil (...) por sus dificuldades interiores»19. O mesmo raciocinio seguia*se para esse «Imperiosinho Jugoslavo, com populagóes táo heterogéneas como era o Impèrio Austríaco, que por essa razáo se dissolveu em Versailles»20, de que falava um diplomata portugués táo moderado quanto Joao de Bianchi; para o Mundo, «la vida de la Yugoslavia nacida de la postguerra de 1914 no podía desenvolverse porque, aunque de la misma raza, entre los diferentes territorios habían diferencias de siglos»21.

E a Polonia? «La nacida en Versalles», escrevia-se no Mundo, «fué, o demasiado inmensa o demasiado reducida, carente de fronteras naturales, con un "pasillo de imposible defensa militar"». De resto, a Alemanha derrotada em 1918 saia de Versalhes «rodeada por países de segunda o tercera categoría, destinados a ser absorbidos por ella»22. As Repúblicas bálticas? Os «lituanos, letones y estonianos» que, «desde hacia dos siglos, aproximadamente, pertenecían al Imperio ruso después de

17 «Antecedentes do Protocolo ao Tratado de Amizade com a Espanha», relatório de Theotónio Pereira, s.d. (mas provavelmente de 1942).

18 Cf. o seu relatório «Subsidio para urna síntese crítica do Imperialismo Político da Alemanha», entregue do M.N.E. em Junho de 1943 (in A.M.N.E.).

19 «Los ocho puntos de Roosevelt y Churchill son muy inferiores a los catorce de Wilson», in Mundo, n2 68 (24/8/1941), Madrid, pp. 648*49.

20 Oficio de Bianchi a Salazar, 22/7/1944, in A.M.N.E., 2e/49/96. 21 In Mundo, n2 50 (20/4/1941), Madrid.

(18)

3 9 0

haber sido dominados por los germanos, polacos y suecos», constituíram «países son demasiado e x ig u o s para llevar una vida realmente independiente», «demasiado pequeños para permitirse el lujo d e la independencia completa, siempre bastante costosa». Na opiniáo do Mundo, «han de servir, ya c o m o puertas de Moscovia hacia el Occidente, o como rejas que la separan del Occidente»; de preferencia, a segunda hipótese, mas para tanto «será menester que la U.R.S.S. quede completamente derrotada»23.

europeus, que «en Europa es preciso operar sobre la base de un triunfo del Eje, pues en la h ip ó te s is contraria sería imposible predecir los recursos geográficos que el "super-Versalles" que se e la b o ra ra utilizaría para fragmentar a Alemania y a sus aliados balcánicos, Hungría y Bulgaria». Salazar, c o m o veremos ao se analisar a sua reacgao e interpretado do ataque á Uniáo Soviética, nao estaría longe d e subscrever este ponto de vista. Em todo o caso, o que se previa desde os postos oficiáis espanhóis d e observado era um «futuro de Bélgica y Holanda, o quizá de Holanda con Flandes y de Volnia [sic]24, [que] se ligaría estrechamente a Alemania». Mesmo raciocinio para a Escandinávia, «más o m e n o s federada entre sí»25. Por outras palavras, a tese, de resto muito comum, era a do agrupamento d e entidades estatais que partilhassem conjuntos geográficos mais ou menos homogéneos, compactos.

problema da visáo que da ídentidade de Portugal se desenvoiveu na Espanha deste primeiro Franquismo. Mas adiantemos que um militar tradicionalista como Alfredo Kindelán, urna das personagens oficiáis d o período mais vezes apresentado como exemplo de opositor das teses e das tentativas falangistas ortodoxas no seio do regime, sustentava, táo tarde quanto 1943, a típica reivindicado fascista de que a «Europa necesita una nueva ordenación [porque] no es posible seguir en este régimen anárquico, d e minúsculos Estados soberanos que se creen con derecho a desarrollar sus políticas, como si ocuparan una isla apartada y no fueran, como son en realidad, piezas de puízfe [sic]». Quando assegura que «la hora de Portugal», entre outros Estados, «pasó», porqué duvidar que este se incluiria no rol dos «minúsculos Estados» supérfluos? (cf. KINDELÁN, 1943:202,196).

Seguindo um raciocinio nacionalista, os salazaristas nao deixaram evidentemente de se colocar o problema da «fragmentado» da Espanha, e dos seus efeitos no relacionamento com Portugal e na configurado futura da Península. E de a receberem bem, ao contràrio do que a versáo que, a posteriori, o regime portugués divulgará, com sucesso. Depois da proclam ado da República espanhola mas antes do desencadeamento do conflito armado, eram táo significativas as vozes que, no interior do sistema

23 «Alemania confiere a los países bálticos una amplia autonomía administrativa y cultural», in Mundo, n2 103 (26/4/1942), Madrid, pp. 675-76.

24 Pretendia-se, seguramente, dizer Valonia.

25 «El mapa de varios continentes ha sufrido, en este año de 1941, profundos cambios, algunos definitivos y otros provisionales», in Mundo, n2 86 (28/12/1941 ), Madrid, pp. 645-47.

No fim de 1941, o Mundo assumia, sem rodeios, a propósito dos «futuros m a p as»

Como a Península Ibérica? O que se reservaria entào a Portugal? Deixemos aparte o

(19)

diplomático portugués, se pronunciavam a favor do que Ihes parecía ser a fragm entado do Estado espanhol que a sua opiniáo nao poderia senio representar urna co n c e p to , estruturalmente nacionalista, evidentemente, e necessariamente partilhada pela elite política do Salazarismo.

Na maioria dos dignitários intelectuais das direitas portuguesas présalazaristas predominaram teses como a de António Sardinha que concebera históricamente «a Península repartida em diversas nacionalidades», mas concedendo «a cada urna um papel marcadamente distinto» na História, numa lógica organicista que revertía a favor de urna tese final dualista: «É Castela quem no interior avoca a si a continuado da guerra contra o Mouro. Aragoneses e cataláes espalham-se pelo Mediterráneo (...)■ A nós toca-nos a empresa de Marrocos e a epopeia do Mar». Mas «se tais m anifestares sao variadas e por vezes divergentes ñas suas linhas ¡mediatas, reconhecemos que as ilumina e conduz como que providencialmente a presenga suprema de urna finalidade comum», mas com duas «vocagóes»: a «terrestre» de Castela, fundida entretanto com Aragáo, enquanto a «marítima» era «concretizada» por Portugal. De forma aparentemente contraditória - como tanto ñas teses de António Sardinha -, garantia-se que «a unidade do gènio peninsular, na sua projecdo histórica-social, foi garantida pela separado política de Castela e Portugal, providencialmente assegurada em AIjubarrota e nos camposdeToro» (1943:153-54).

A franca hostilidade que resultara do receio salazarista dos efeitos que a nova República democrática espanhola poderia suscitar em Portugal, alteraría significativamente o quadro geral da interpretado que da pluralidade espanhola se fazia do lado de cá da fronteira. De facto, ao abrigo do Titulo I da C onstituid0 da República espanhola de 1931, viriam a aprovar-se os Estatutos de autonomia cataláo (plebiscito de Agosto de 1931 e v o ta d o parlamentar de Setembro de 1932) e basco (plebiscito de Novembro de 1933 e v o ta d o parlamentar de Outubro de 1936), que permitiram a co nstitu id o de govemos regionais na Catalunha e no País Basco (sem a Navarra), o segundo dos quais, no entanto, já durante a guerra mas ainda sob a legalidade republicana. Um terceiro Estatuto, o galego, chegou a ser aprovado em plebiscito pouco antes da guerra (Junho de 1936), mas nao só nao chegou a passar pela aprovad0 das Cortes, como a Galiza foi ocupada logo nos primeiros dias do levantamento militar franquista. Para o embaixador portugués em Madrid, Melo Barrato, emergía em 1932 urna «"concepd0 do Estado espanhol oposta á unidade tradicional11» que «"diminuirá a Espanha"», e que, portanto, «"nao deveria ser contrariada, mas, pelo contràrio, ser auxiliada, se for possívelV Para Vasco de Quevedo, representante portugués em Berna, de onde transitará, durante a Guerra de Espanha, para a Roma de Mussolini, «"Portugal deve nascer com a m u tila do de Espanha"» (cits. in TORRE, 1989: 4426), porque disso se tratava na visao de nacionalistas unitaristas como eram os dirigentes salazaristas.

A fase em que o Estado Novo portugués se concentra pela primeira vez, em 1935-37, na concepdo e d e fin id o de urna política m ilitar a longo prazo, naquela que a generalidade dos autores

(20)

3 9 2

admite ser «a maior reforma militar» do regime de Salazar27, coincide com a conjuntura de agravam ento da conflitualidade política na República espanhola que desemboca na Guerra C ivil. Se é certo que a obsessáo permanente do novo regime portugués se centrava no potencial subversivo que representavam as forças de esquerda espanholas, algumas das quais abstractamente federalistas quanto à soluçâo d o problema multinacional do Estado espanhol28, entre os meios militares, habituados a considerarem a Espanha como o «inimigo tradicional» da independéncia portuguesa, e enquanto nào se desencadeia a Guerra Civil, ampliava-se a convicçâo de que «a falta de unidade completa por parte da Espanha» funcionava como factor «favorável» para Portugal num eventual embate militar. A descriçào que o jo v e m colaborador de Salazar, o capitáo Santos Costa, fazia da pluralidade nacional espanhola num docum ento de Outubro de 1935 era a de que «a acçào [do Estado] vizinho» nao tena conseguido «destruir realidades geográficas como a Catalunha, as Vascongadas e a Galiza» (C.L.N.R.F., 1988: doc. 1329). É básicam ente esta a tese que é usada pelo próprio Salazar meses mais tarde quando, em «sucessivos Conselhos d e Ministros efectuados em S. Bento entre 10 e 15 de Fevereiro [de 1936]», se procura definir urna «nova política m ilitar e execuçâo do programa de rearmamento». Franco Nogueira faz urna ampia referencia a urna «minuta elaborada por Salazar» que pretende ter seguido «rigorosamente» mas que náo se encontra em qualquer arquivo oficial, de cuja análise se deduz que o govemo portugués, em plena cam panha eleitoral que conduzirá à Vitoria da Frente Popular em Espanha, está convencido que a «dissoluçâo» ou a «desagregaçào espanhola», fruto das suas «divisées internas (Galiza, Vascongadas, Catalunha)», tom aría «improvável [qualquer] ataque» de Espanha (cf. NOGUEIRA, 1977a: 353-59).

Quase très décadas mais tarde, Santos Costa regressaria a esta questâo quando lhe é oferecida a oportunidade de apresentar os documentos diplomáticos portugueses que poriam «em evidencia as razôes profundas da posiçâo portuguesa em face dos dramáticos acontecimientos que ensanguentaram a tema de Espanha» aquando da sua «guerra de libertaçào», expressâo com a quaJ tanto salazaristas como franquistas qualificavam o conflito de 1936-39. Em 1964, Santos Costa adm itía

27 Culminaría, do ponto de vista da decisâo política, na promulgaçào das Leis nas 1960 («Lei da organizaçào do Exército») e 1961 («Lei do recrutamento e do serviço militar»), de 1/9/1937, transcritas in C.L.N.R.F., 1988: 394-430. Cf. CARRILHO, Maria (1985). Forças Armadas e mudança política em Portugal no sáculo XX. Para urna explicaçâo sociológica do papel dos militares. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda; FARIA, 2000; FERREIRA, José Medeiros (1992). O comportamento político dos militares. Forças Armadas e regimes políticos em Portugal no sáculo XX. Lisboa: Estampa; TELO, Antonio José (1996). «Política de defesa», in ROSAS, Femando; BRITO, J. M. Brandáo de (dir.). Dicionário de Historia do Estado Novo, vol. 11. [S.I.:] Círculo de Leitores, pp. 759-65.

28 A Constituiçâo republicana espanhola de 1931, no entanto, interditava explícitamente o modelo federal (cf. art. 13a).

29 «Rearmamento do Exército. Parecer», de Femando dos Santos Costa, 14/10/1935. Santos Costa (1899-1982) começara por desempenhar f unçôes técnicas no Ministério da Güeña, entre 1931 e 1933, e na Presidéncia do Consetho, junto de Salazar, entre 1934 e 1936, tomando-se Subsecretário de Estado da Güeña em 1936 e até 1944, enquanto Salazar acumula também essa pasta ministerial, sucedendo entáo directamente ao ditador no cargo de ministro.

(21)

perguntar-se «se a melhor defesa dos interesses portugueses em face da guerra de Espanha estaría numa política que conduzisse à balcanizagao da Península e ao desmembramento do potencial político, economico e m ilitar espanhol», proporcionados pelo «inesperado prolongamiento da guerra» que teña permitido «o aparecimiento de sentimientos de autonomia e independencia que o pó dos séculos havia sufocado», entre outros, nos «casos de Navarra e da Catalunha, onde govemos autónomos chegaram a ser constituidos»30, esquecendo-se de que um ano antes de desencadeada a guerra havia ele pròprio sublinhado o vigor desses «sentimientos». «Urna política de apoio a essas independéncias sería realmente aconsethável?», perguntava-se, retórico, para logo considerar «pouco avisados» os «espíritos» que julgassem que «a fragmentagáo do poder espanhol conduzirìa a urna mais forte projecgáo de Lisboa no tablado da política mundial», tese, no entanto, absolutamente coerente com o prisma nacionalista atrás do qual se posicionavam os salazaristas. «Nao o julgou assim o Governo de Lisboa», para quem a «pulverizagáo política da antiga Ibéria» constituiría «um foco de constantes perturbagöes» e «urna porta aberta à invasáo comunista», optando por «se bater em todos os campos pela vitória da verdadeira Espanha, redimida e reintegrada ñas suas ancestrais tradigóes cristas, una e capaz de resistir a todos os embates a que certamente iría ser submetida» (M.N.E., 1964: vii, xiii-xiv, xvii31).

Esta sería a tese que o regime salazarista imporia dentro das suas fileiras, em primeiro lugar, e que veicularia para a generalidade dos suportes em que circulava a opiniáo autorizada. Táo cedo quanto durante a pròpria Guerra Civil. À saída desta, o emblemático capitáo Jorge Botelho Moniz32 seria encarregado de, a coberto do pseudónimo X.Y.Z. que assinava as suas crónicas em Saiamanca33, expor retoricamente as duas perspectivas que, a partir de dentro do sistema de poder salazarista, se haviam

30 Santos Costa comete aqui um erro grosseiro: os Estatutos de autonomia aprovados, completa ou incompletamente, haviam sido tres, como já vimos: o catalào, o gaiego e o basco, mas neste último caso justamente sem a provincia de Navarra.

31 «Preámbulo» aos tres volumes que cobrem o confuto espanhol. Santos Costa fora nomeado, curiosamente pelo jovem director-geral do M.N.E., Franco Nogueira, presidente da «comissáo que há-de coiigir os documentos relativos à política externa de Portugal durante a última guerra» (Portaría do M.N.E., 15/1/1960).

32 Jovem oficial direitista, envolvido logo aos 19 anos na conspi ragao de Dezembro de 1917 que leva Sidónio Pais ao poder, e ñas manobras das torgas que procurara, de novo desde 1919, o firn do regime republicano liberal, participa activamente na repressao violenta de todas as tentativas antiditatoriais dos anos 1927-31. Fundador e director da estagáo privada Radio Clube Portugués, destaca-se na campanha de apoio à rebeliáo franquista em Espanha, fazendo parte da Missáo M ilitar Portuguesa de Observagáo em Espanha, verdadeira coordenadora da participagáo de militares portugueses do lado de Franco. Em 1936 é também um dos animadores da constituigáo da m ilicia do regime (a Legiáo Portuguesa). Delegado especial do Ministério da Guerra para a mobilizagáo industrial durante os anos da II Guerra Mundial, faz urna saltuària carreira por postos de representagào do regime (deputado à Assembleia nacional em 1945- 49, procurador à Cámara Corporativa em 1957-61, colecciona vários cargos empresariais por indicagao do Governo.

33 A Embaixada de Espanha em Lisboa sabia bem que se tratava de Botelho Moniz - cf. oficio de Nicolás Franco a Jordana, 16/5/1939, in A.G.A., AE/6644.

(22)

394

subscrito acerca da crise do centralismo estatal espanhol e do seu impacto na independencia p o lític a portuguesa. O raciocinio seguido por um partidário, nao identificado, das teses tradicionalm ente antiespanholas do nacionalismo portugués, que Botelho Moniz classificava como «pseudo-maquiavélico», partía do principio de que Santos Costa e Salazar haviam partido:

«MA Espanha, govemada por urna República desordeira, marcha a passo de gigante para o enfraquecimento. Apesar da sua Historia gloriosa e da sua existéncia centenaria, nao conseguiu, até hoje, realizar a unificado. Dividida por particularismos rácicos, minada por odios políticos, é vizinho que nao nos assusta. Convém-nos, além dísso, que a guerra dure e a enfraquega m a is ainda. Convém-nos que termine, nao pela Vitoria nítida dum dos partidos, mas por um compromisso que a deixe em situagáo política idéntica á anterior e em situagáo geral de fraqueza maior..."»

Moniz reconhecia que, «a primeira vista», tal tese «pode parecer muito exacta e m uito patriótica», omitindo, obviamente, que havia sido aquela que triunfara nos meios oficiáis salazaristas a té ao desencadeamento do proprio levantamento m ilitar franquista. E expóe as consequéncias de tré s possíveis solugoes para a guerra.

«Se fica tudo como dantes, o separatismo conservar-se-á e tenderá até a progredir para os lados da Galiza, onde ¡á come90u a soltar os primeiros vagidos. A Espanha transformar-se-á num a República federativa, dentro da qual se avolumaráo as tendencias de incluir Portugal».

«Conhecidas as ligagóes entre os emigrados [políticos] portugueses e os republicanos espanhóis», M oniz insinuava que aqueles «venderiam a independéncia completa pelo prato de lentilhas do auxilio para a reconquista do poder». Em todo o caso, «a luta em Espanha é de vida ou de morte. Nao há acordos possíveis», estes seriam necessários para que «tudo f¡casse na mesma» e, portanto, esta hipótese era de excluir.

«Se ganham os vemnelhos, triunfa o imperialismo russo. A Espanha federativa ou unificada pela máo férrea dos comunistas realizará a sua ameaga de guerra a Portugal. (...) Esse perigo é tanto m ais grave quanto é certo que o comunismo encontraria dentro de Portugal o apoio das esquerdas. Os homens que obedecem às ordens de Moscove, os sem patria, os inimigos da actual situagáo política anunciariam esse ataque como urna marcha, nao de conquista, mas de libertagáo. Seriam miihares de espióes e de agentes do estrangeiro dentro do nosso pròprio territòrio, a colaborarem consciente ou inconscientemente com o agressor».

Por outras palavras, o regime sabia que «a Vitoria dos vermelhos» em Espanha, «além de representar o perigo ¡mediato e seguro, representará também a divisáo de Portugal em dois partidos», e esse era o pior cenário para quem procurava instaurar urna ordem política de cariz nacional.

Um perigo «¡mediato e seguro» representavam os rojos espanhóis. Por oposigao, «a vitória dos sublevados», ou seja, dos franquistas, «nao apresenta perigos semelhantes». Havia que admitir que alguns existiriam, seguramente porque a maioria da opiniao pública portuguesa os pressentiria, mas havia também que sublinhar que estes eram claramente inferiores. «Mesmo na hipótese absurda da cegueira imperialista perturbar os ánimos dos vencedores» franquistas, comegava por adm itir Botelho Moniz, num artigo que se publicava um mes depois do triunfo do Caudillo,

«os primeiros tempos a seguir à paz seráo de ternura mùtua, porque nos estamos a ajudar a vitória. (...) A nossa atitude de franco apoio, semelhanga de doutrinas políticas, as amizades cultivadas durante a luta e, acima de tudo, o sentido tradicional de auxilio mùtuo que nunca falhou entre as duas nagóes da Península e sempre as uniu perante o perigo comum, constituirao

(23)

t ; um escudo moral que julgamos intransponível»

-- e eis aqui o argumento que perpassaria todo o discurso que o proprio Salazar veicularia para dentro do seu regime, avanzado justamente para contrariar abertamente quem se recusava a acreditar na boa fé dos novos govemantes nacionalistas de Madrid. Ou, como escrevia Moniz, «para definir responsabilidades e fixar doutrina».

«A gratidáo [espanhola] pode desaparecer rapidamente», continuava Moniz, «os govemantes podem mudar, mas nao antes de estarmos preparados, porque os nacionalistas só conseguirlo a vitória à custa de luta demorada. Além disso, contra o imperialismo nacionalista,» - nada menos! - «nós conseguimos a perfeita unidade dos portugueses», além de que «teríamos o apoio certo da Inglaterra». Em síntese, e atentemos bem na natureza da alternativa formulada, «entre um perigo certo e ¡mediato, que nos encontra mal preparados e divididos, e um perigo improvávele longfnquo, contra o qual conseguiríamos a unidade pàtria, o prazo necessàrio para a nossa p re p a ra lo m ilitar e o auxilio da nossa aliada, esoolhemos este último e seja o que Deus quiser!»34

Assim, a contradigáo flagrante entre a tese da ameaga iberista de opgáo federal, que seduziria grupos da oposigáo portuguesa exilada em Espanha e sectores do poder republicano espanhol, e a convicgáo estratégica que justamente tais pulsoes federalistas ou separatistas diluíam, a partir de Espanha, qualquer perigo para a independencia portuguesa, nao pode deixar de reforgar a convicgáo de que era, antes de mais, o critèrio ideológico que passare a primar na reflexáo nacionalista antiespanhola do Salazarismo.

Nao admiraría, assim, que os dirigentes do Estado Novo se viessem a sentir particularmente ludibriados perente as ameagas que percepcionavam na triunfante coligagao franquista, aínda antes de terminada a guerra em Espanha, como veremos já a seguir. O que reforga a contradigáo que abre a ambiguidade de posturas como aquelas em que caíam os que se autodefiniam como nacionalistas portugueses, ao encarreirarem com aqueles que, no universo eurofascista, misturavam discursos sobre a inviabilidade dos pequeños Estados com o da artificialidade de vários deles. Surpreendamos, por exemplo, a paradoxal apreciagáo que o proprio Salazar fazia da pretensa «atomizagáo», filha directa de Versalhes, das unidades políticas soberanas da Europa. Eia está claramente presente antes do desencadeamento da guerra mundial, por exemplo na peroragáo que o ditador dedica à

«política idealista, presa de certos grandes tropos conhecidos e de algumas frases feitas (...): a miragem crédula da "paz universal e indivisível" e da "seguranga colectiva", dos acoróos e pactos no "quadro da Sociedade das Nagóes" (...) entrincheirada no dogma da bondade dos homens e da inocéncia das nagóes, no sonho da paz perpètua entre os povos, como se todos fossem pacíficos e estivessem contentes, na aboligáo das guerras, na possibilidade do desarmamento integral, na virtude imánente do direito e da justiga»,

34 «Portugal perante a vitória de Franco: as influencias estrangeiras em Espanha. O que representaría para nós a vitória dos vermelhos e o que representa a vitória dos nacionalistas», in Diàrio de Lisboa, 2/5/1939; itálico no original.

(24)

I là mn n t t l i l i i á i ft'M N T ( f

3 9 6

o que, segundo Salazar, tena levado a Europa «por mais de urna vez à beira da catástrofe». Tal «idealismo pacifista» opor-se-ia a urna política «realista» «aureolada por alguns grandes sucessos», a adoptada por

«outras naçôes [que] aplicaram métodos diferentes e obtiveram incontestáveis triunfos. Com inteiro conhecimento das circunstancias, das posibilidades próprias e alheias, houve realismo no Sarre35, realismo na Renánia, realismo em Dantzig [sic]36, realismo no Anschluss, do outro lado houve e ainda há realismo no Brenner em 1 9 3 4 , na adesáo ao acordo de Nyon para a fiscalizaçào do Mediterráneo em 193738, no recente convénio anglo-italiano39, e até nos contidos sentimentos com que se aceitou o desaparecimento da Austria» (SALAZAR, 1943:75-7740).

Salazar, note-se, acrescenta que «esta política fascinará em breve as inteligencias e apresentará o perigo de arrastar as vontades para o que no meu pensar é já desvirtuamento da política realista - a política do facto consum ado, a política da força», concluindo: «Eu sei que a razáo também tem força; por outras palavras, também é urna realidade (...). Mas ninguém tem dúvidas que essa força nâo basta» (SALAZAR, 1943:77-7841).

35 Anexagáo, por via plebiscitària, da regiào à Alemanha, em Janeiro de 1935, depois de quinze anos de mandato da S.D.N..

35 Revela-se-nos difícil perceber a inclusào, na Primavera de 1938, do problema de Danzig no conjunto dos sucessos da «politica de realismo». De facto, desde 1934 (assinatura do Pacto de Nao-Agressào germano-polaco) e até Outubro de 1938 que a questào nào era levantada pelo regime nazi. Supomos que Salazar se referiria pura e simplesmente à form a corno em Versalhes, em 1919, à Alemanha derrotada havia sido imposta a solugào cidade-livre para Danzig e o territorio adjacente.

37 Depois de proteger a ditadura austrofascista do católico Engelbert Dollfuss (1933-34), Mussolini marca urna posigáo contra as pretensóes anexionistas alemas ao enviar destacamentos militares para a regiáo fronteiriga do Brenner, nos Alpes, na sequència do assassinato do ditador austríaco aquando de urna tentativa de golpe de Estado nazi. No entanto, no ámbito da sua política de aproximagáo à Alemanha nazi, a Italia fascista abandonará a experiencia fascista austríaca à sua sorte, permitindo que Bertim imponha em 1936 ao novo ditador de Viena, von Schuschnigg, um tratado que colocava objetivam ente a Austria sob protectorado político da Alemanha. Em Margo de 1938, as tropas alemas procedem à anexagáo (Anschluss) do país.

38 Durante todo o mes de Agosto e a primeira semana de Setembro de 1937, avioes, navios de guerra e submarinos italianos afundaram em distintos pontos do Mediterràneo urna sèrie de navios de várias nacionalidades presumivelmente transportando mercadoria para portos da Espanha reepublicana. Os govemos francés e británico acordaram convocar para a cidade suíga de Nyon urna conferencia dos países ribeirinhos, aos quais se acrescentavam a Alemanha e a U.R.S.S., para abordar a questáo da pirataria naquele mar, urna vez que tais ataques nao eram assumidos por nenhuma poténcia. Na ausencia das representagóes italiana e alema, a conferencia estabeleciam que a marinha de guerra francesa e británica patrulhariam a zona do Mediterráneo situada a oeste de Malta, o que, naturalmente, terá enfurecido Mussolini, sem que tal o impedisse de continuar com as actividades de torpedeamento»... Cf. THOMAS, 1988:797-801.

Acordos de Roma (Abril de 1938), pelos quais o governo británico pelo qual se comprometía a agir junto do Conselho da Sociedade das Nagòes para fazer reconhecer a anexagáo da Etiopia pela Itália.

40 Itálico e sublinhado no original. 41 Sublinhado no original.

(25)

Por entre a aparente equidistáncia que Salazar parece subscrever neste discurso de Abril de 1938, pouco depois da anexaçào da Austria, denuncia-se aquilo que nao pode ser considerado menos que adesâo. Logo seis meses mais tarde, face ao exemplo máximo desse mesmo «realismo», a Conferencia de Munique, o ditador, elogiando a «¡ndiscutível glória de Chamberlain, a quem o Chefe do Govemo italiano deve ter dado a colaboraçâo decisiva do seu génio político», afirmava:

«Saíram de Munique, senáo urna nova Europa, ao menos as perspectivas de urna Europa muito diferente. (...) acabou-se nos últimos meses a obra de destruiçào de Versátiles e em poucas horas se substituíram por outras as bases que foram da política europeia durante dezenas de anos. Isto nâo é necessariamente a guerra. Pelo contrario, é bem possível encontrar para os problemas que ficaram ou surgiram desta crise soluçôes de colaboraçâo amigável, talvez até com mais facilidade que nas circunstancias anteriores».

Mais: referindo-se à Alemanha, recordava que «era preciso (...) nâo esquecer que os povos, como os individuos, precisam de ser tratados com justiça». Para ele, em Munique

«sucedeu a acçào a vagos discursos sem sentido; despiram-se os homens de Estado de mesquinhos preconceitos da política partidária; enfrentou-se a realidade senâo a justiça de certas aspiraçôes; a força começou a revelar a sua presença; modificava-se o mapa da Europa no respeitante a quatre naçôes» (SALAZAR, 1943:110 e 108-0942).

Quanto à «justiça de certas aspiraçôes», Salazar parecía nâo esconder em 1938 dar razâo a quem pretendía a reuniáo de todos os germanófonos sob a soberanía do Reich, além de dentro do seu aparelho diplomático avultar quem responsabilizasse «o odio atávico dos techecos [sic] contra os alemáes» como factor desencadeador do desmembramento dessa «criaçâo artificial obra do Tratado de Versalhes», como o jovem Franco Nogueira, citado há pouco, descrevia a Checoslováquia. Indubitavelmente já «fascinado» pela «eficácia» da política «realista», um mes depois da derrota polaca, em 1939, lamentará «nâo se ter levado a Polonia a aceitar as bases do discurso de Hitler (...) pois que a guerra veio a rebentar sobre questâo em que a Alemanha», urna vez mais, «tinha alguma razâo» (M.N.E., 1970: doc. ns 12343) - precisamente a mesma tese que se defende no franquista Mundo, quando se escrevia a propósito da «ciudad y el pasillo de Dantzig, motivo ocasional de la guerra», os quais, «pese a su indiscutible germanismo y a que dividía en dos trozos a Alemania, Hitler ofreció una fórmula transaccional aceptable», que «sólo la intransigencia polaca, alentada por Londres y París» fez com que nâo fosse aceite44.

Também aqui o lastro de urna origem conflitual que transportava consigo o Franquismo nâo o faz distinguir do Salazarismo. A percepçâo salazariana daquela Europa «muito diferente» que saía de Munique era, afina!, muito semelhante à dos falangistas espanhóis. Quem, como Manuel Aznar, descrevia o Tratado de Versalhes como urna «balcanización» forçada da Europa central, nâo podia deixar de «esperar que Alemania, unida y única, absorviera aquel ajedrez de fingidas independencias». Urna délas, a checa, tena sido de resto conseguida porque «tenía de su parte a todas las sectas del mundo».

42 Discurso perante a Assembleia Nacional, 27/10/1938. 43 Telegrama de Salazar a Monteiro, 9/10/1939.

(26)

B —

i

3 9 8

Quando na capital bávara, e na ausencia de qualquer representante do governo de Praga, se negociou o firn formoso da integridade territorial checoslovaca, dissolvendo aquele que era considerado um Estado «artificial» pelos criterios do ascendente fascismo internacional, na Espanha de Franco também se d iz ia ver «qué alivio, qué reposo espiritual, qué júbilo y contento» pelo «mundo entero cuando se conocieron lo s resultados de la Conferencia de Munich!»; e também ali se jurava ouvir «en todas partes bendecir e l nombre de Mussolini, salvador de la paz!» {AZIMAR, 1941: 13, 257, 280 e 273). Ortega y Gasset, tem porariamente refugiado na Haia para evitar o desconforto da Espanha em guerra, escreve a Gregorio Marañón e felicita-se pela «"articulación provisoria"» que se tena establecido em Munique «"entre lo s Estados totalitarios y los liberales’ » com «"una enorme victoria de aquéllos"», que Ihe permití ria exclamar: «"[Los europeos] hemos nacido!"» (cit. in PALACIOS, 1999:164-65).

Para um dos mais académicos produtores de reflexáo franquista sobre tem as intemacionais, o professor Camilo Barcia Trelles, a poucos meses do desencadeamento da li Guerra Mundial, a Europa era já um continente em cuja «vida internacional [había sido introducido] un claro criterio realista», obviamente corrector do papel de «unas minorías a expensas de las cuales se intentó constituir Estados que precisamente por abarcar dentro de sus fronteras elementos exógenos, carecen d e viabilidad» (BARCIA, 1939:309 e 24), verdadeiros «artificios sin sentido, incapaces, según se ha visto, d e resistir los primeros soplos de la adversidad», ainda por cim a responsáveis pela «desaparición de una d e las creaciones políticas más prodigiosas que ha conocido la Historia» - o Impèrio Austro-Húngaro (AZNAR, 1941:13).

6.3 «La hora de P ortugal pasó»

O prisma através do qual o Franquismo oficial e oficioso encarava o pluralismo estatal e nacional do continente europeu permite-nos interpretar de forma mais reveladora a ambiguidade essencial do discurso franquista perante a individualidade de Portugal no quadro da Península Ibérica. Na publicística e na produgao teórica mais ou menos elaborada do primeiro Franquismo encontramos frequentes referencias a um «destino común de España y Portugal [en la] realización de una misma tarea de elevada significación universal», ou à tese, muito corrente nos meios intelectuais espanhóis cujas fronteiras superavano as do regime, de que ambos os Estados «deben integrar un conjunto superior, que no menoscabe su personalidad particular» (CORDERO, 1944:23).

Todos os discursos nacionalistas espanhóis que expunham alguma tese sobre a inconsisténcia política da existencia do Portugal contemporáneo sustentavam-se sobre urna legitim ado histórica. Ás m ilitantes da Sección Femenina do partido único, explicava-se, durante a II Guerra Mundial, a propósito da «unidad peninsular», como era sobejamente «conocido, desde el principio de la historia de Portugal, el miedo que sintió siempre esta nación a unirse a España, y las dificultades que en todo momento presentaron los enemigos de que se verificase esta unión ibérica», geralmente apontados como sendo exteriores à Península. Já «en el sigio XIV no comprendían [los portugueses] cuán impolítica para

(27)

io futuro había de resultar la separación ibérica, cuando las condiciones geográficas y sociales aconsejaban una indisoluble unión, base de fuerza y poderío», sustentava-se num manual histórico de p ro d u jo e difusáo oficial, onde se cometiam erros táo garrafais como o de designar o Infante «Enrique, el Navegante» como «monarca» portugués.

A ideia da «unidad peninsular» é apresentada sistematicamente como um objectivo essencial da construgáo do Estado espanhol, da Espanha como «unidad peninsular», como um verdadeiro «sueño» dos melhores dos seus monarcas e govemantes, os «Reyes Católicos» em primeiro lugar. Quando por firn se realiza no final do séc. XVI, «es una nación [sic] tardía, cuando España y Portugal se han fatigado de Imperio [sic], cuando el optimismo de lo logrado viene a ocultar los peligros circundantes. Portugal en 1580 es una nación exhausta, sin nervio. No tiene ya ambiciones ni siquiera para defender su Imperio en las Indias, un Imperio que va a ser presa de piratas ingleses y holandeses» [F.E.T. Y DE LAS J.O.N.S. (SECCIÓN FEMENINA), s.d.: 47, 26, 48]. Pelo contrario, quando nasce «la leyenda del Rey Don Sebastián de Portugal», ¡mediatamente se denuncia o seu «carácter eminentemente político». O discurso nacionalista espanhol assumia aqui, reveladoramente, o seu papel de projecto político sabotado pelo que a Historia da cultura portuguesa designou por mito sebástico, o de um jovem rei que o mito descreveria como havendo desaparecido no campo de batalha mas que regressaria encobertó*5, numa manhá de bruma, ao seu Reino para o resgatar, numa lógica messiànica que a generalidade dos estudiosos aíirmam ser de gosto judaico. «Todos sabían que había muerto en la batalla de Alcázarquivir, pero mantenían la duda para crear dificultades a Felipe II en su acción en Portugal», denunciava o oficioso Mundo em 194245 46.

No ano de todas as comemoragóes nacionalistas portuguesas, 1940, Beneyto dedicava toda urna última parte do seu lívro sobre o Genio y Figura dei Movimiento ao tema «Hacia Portugal, que es vocación común», e garantía ao público espanhol que «1640 no representa una oposición a la alianza en el sistema dual que se mostró tan eficaz en la época de los Felipes»47, numa interpretado francamente voluntarista da Historia, pressupondo a existéncia histórica de algo tào duvidoso quanto urna monarquía dualista hispanoportuguesa nesse período e passando por cima das grandes derrotas políticas sofridas pelo Impèrio espanhol. Neste sentido, a Restaurado portuguesa teria sido «la reacción contra las tesis y las actitudes asimilistas» (BENEYTO, 1940:211), o que era dizer muito mais do que alguma vez o regime admitiría perante outras identidades nacionais ibéricas.

No mesmo ano, Alvaro Seminario, ao mesmo tempo que era nomeado cónsul em Sáo

45 É este o nome que muitas das sucessivas versóes do mito de D. Sebastiáo (1554-78) atribuem ao jovem rei morto na batalha de Alcacer Quibir, no Norte de África. É na sequéncia do seu desaparecí mentó, nao deixando herdeiros directos do trono de Portugal, que este é reivindicado e conseguido por Filipe II de Espanha.

46 In n2 116 (26/7/1942), Madrid, pp. 494-95.

(28)

4 0 0

Paulo, publicava urnas Incitaciones a una política de acercamiento espiritual entre Portugal e Espanha e m que reconhecia que «lo que venció, lo que decidió la jomada de Aljubarrota48, fué la voluntad de lo s portugueses de ser independientes», o que Ihe permitía também desmentir as teses dos «historiadores ingleses [que] os dirán que en Aljubarrota triunfó la táctica de los oficiales británicos». O escritor espanhol garantía até que, «sin esfuerzo, sin intervención del raciocinio, con sólo librar de coacciones al corazón, sentí en aquella hora [delante de Aljubarrota y de Batalha] una honda y cordial emoción fraterna, y m i pecho se abrió a la esperanza de un mañana venturoso para Portugal y España fundidos en un m ism o ideal».

Para tal, urna vez mais se recordava Antonio Sardinha, «noble amigo de España», q u e teria «pedido la unión de ambos pueblos peninsulares para la realización de una noble y elevada empresa», a da «"guarda e prestigio de um tipo de civilizagáo a que todos os hispanos igualm ente pertence (...) como simples programas de c o n s e rv a lo e afirmagao dum natural e ¡rresistrvel supem acionalism oV Para chegar à «inteligencia de los dos pueblos hermanos» era, isso sim, necessàrio «desviar lo que más nos divide - la teoría absurda de la esclavitud de Portugal durante la época de lo s Felipes». Pelo contràrio, havia nao só que revalorizar esse período aos olhos dos nacionalistas portugueses, como também aos dos espanhóis. Por exemplo, dando um sentido atlántico, marítimo, à retórica franquista do Imperio, «porque hispanoamericanismo, en su significación más honda y entrañable, es conciencia atlántica». «Se escribe en España, de raro en raro, acerca de la necesidad de crear un sentido atlántico entre las clases directoras y el pueblo español». Ora, para «formar en España una clara conciencia atlántica», «nada más eficaz que el estudio de la historia portuguesa», e que regressar a Filipe II que «vió con claridad que nuestro porvenir imperial estaba en ese mar». Por isso, «no conquistó a Portugal con afán exclusivo de dominio, sino para que prosiguiese, unido a España, su gesta atlántica» (SEMINARIO, 1940:33-34,23, 50-51).

Com a separagáo da Coroa portuguesa confirmada em 1640, perdera-se nào só urna grande oportunidade histórica - a do Imperio, assim mesmo, conjuntura histórica desta forma designada -, mas tam bém se reduzíam severamente as condigdes necessárias para a concretizagao da missáo universal dos dois povos peninsulares, que a literatura nacionalista espanhola nao se acanhará nada em autoatribuir-se sem ter que contar para nada com a componente portuguesa de tal projecto. «Nunca se repetirá bastante», insistia-se no Mundo no firn de 1940, em artigo que poderia eventualmente ser atribuido a um dos seus colaboradores, Jesús Pabón49 que se haviam distinguido pela dedicagáo

48 Referencia à batalha que a 14 de Agosto de 1385 opóe tropas portuguesas e algumas inglesas, partidárias de D. Joáo, Mestre de Aviz, com o candidato ao trono portugués deixado vago dois anos antes por D. Femando, a tropas castelhanas, partidárias de D. Joáo, Rei de Castela, que reivindicava os seus direitos dinásticos ao mesmo trono. A historiografía portuguesa interpretou, desde o séc. XIX, a vitória portuguesa em Aljubarrota como momento refundador da nacionalidade portuguesa, atribuindo-lhe, como seria de esperar, um significado abertamente nacionalista avant la lettre.

49 Jovem catedrático de História da Universidad Central de Madrid, nascido em 1902, militante monárquico durante a II República, fora nomeado por Serrano Suñer chefe da Propaganda Exterior e da sociedade anónima que gena a agènda noticiosa oficial, a E.F.E. (1940*58). Em 1944, é multado e

Riferimenti

Documenti correlati

Based on Multi Locus Sequence Typing (MLST) analysis, Xf9, the first Apulian strain to be isolated from an olive plant showing leaf scorch and die-back symptoms (Elbeaino et

Real-time polymerase chain reac- tion (PCR) tests for DENV, chikungunya virus (CHIKV), and Zika virus (ZIKV), as well as viral isolation in Vero E6 cell, were also performed

spatial principal Component Analysis (spCA) performed on thracian and modern mtDNA sequences, confirms the pattern highlighted on ancient populations, overall indicating that the

When results were evaluated according to cancer histotype, we found that in adenocarcinomas MMP9 mRNA levels were significantly higher (P = 0.006) in cancer tissues than in

Spread Matrix signature of the system under study are (i) a long decay slope (around 80  ps for SPAD1 and 250  ps for SPAD2) causing a delayed contamination of early real time

Como foi dito anteriormente, são esses elementos que nos permitirão, a partir do estabelecimento de um estreito diálogo entre os estudos da argumentação na língua e a AD, apreender

Individualismo e cooperazione, che appare nel 2002, costituisce il punto d’approdo di una riflessione che Jervis intraprende sul finire degli anni ’70, quando la delusione dovuta

Tuttavia, la sua natura fronetica può costituire fonte generatrice di phronēsis manageriale; ciò si de- ve soprattutto al fatto che la Regola non disciplina il fine della